Sonagachi
Caminhamos pela primeira vez beco a dentro. Sonagachi lembra um labirinto de becos , alguns muito estreitos e outros vão se abrindo até ser possível passar um carro. Sonagachi é o maior distrito de prostituição da cidade de Calcutá. Moramos há 50 metros de lá. Havíamos feito uma caminhada pela manhã, mas dessa vez a noitinha a paisagem é toda muito diferente.
Quando caminho, não sei se olho pro chão pra ver onde piso, pois estou de havaianas e o chão é muito sujo. Não sei se olho para as mulheres pois algumas meninas estão sorrindo pra mim ou para os prédios coloridos ou acinzentados dos quais a maioria são bordéis: "Noite de sonhos"- se chamava um deles.
Vejo um menino de uns 3 anos brincando com uma bacia de água cor de rosa, ele faz bolhas com a boca e sai correndo. Pouco mais adiante está uma senhora de uns 70 anos, já viúva, pois veste branco, agachada. Ela não veste a parte de cima da roupa, a blusinha que acompanha o sare indiano. Quando eu passo por perto ela me olha com um olhar enigmático com uma ponta do sorriso da Monalisa de Leonardo da Vinci. Neste mesmo beco conhecemos a mãe de uma das meninas que trabalha conosco, ela estava "trabalhando". Algumas mulheres me abanam com seu leques e dizem sorrindo: -Está muito quente , você está precisando! E uma delas me ensina a agradecer em bengoli: -"Dhonobad".
Em outro lugar estreito uma senhora me puxou e me cumprimentou apertando minha mão, muito simpática. Alguns homens viram isso e riram dela, ela também riu, eu também ri... Enquanto caminhamos nos becos mais estreitos as mulheres estão sentadas, mas na rua principal é mais difícil olhar pois estão de pé na fila, bem arrumadas e pintadas batendo papo como garotas normais.
Uma menina de sare preto bem vestida chama nossa atenção. A moça que está conosco já a conhecia. Eu me apresento a ela que diz que meu nome é bonito, como não sei falar muito mais que isso, só depois a minha amiga traduziu pra mim que ela é casada e o marido quer que ela ganhe dinheiro para a familia na fila se prostituindo e ela já tem um filho e tem 19 anos. Minha amiga disse que já foi oferecido um trabalho a ela para que ela possa sair da fila, mas ela está adiando comparecer a cada segunda-feira de manhã.
Perto dali uma linda menininha de uns 4 anos caminha com o pai enquanto cresce e se assusta do rato morto que ela quase atropelou. Na saida de um beco vemos um aglomerado de mulheres puxando dois rapazes pra dentro do grupo delas, eles provavelmente já são clientes delas.
Enquanto escrevia esse texto, o menino da casa em frente me chama na janela falando em inglês: Bom dia! Neste momento percebo que o que nos horroriza para eles é algo normal e para eles isso é tudo o que conhecem da vida.
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